A PARTE ESQUECIDA DO SER HUMANO: O IMPACTO DO PERÍODO PRÉ E PERINATAL NA VIDA ADULTA

09/04/2025
Por décadas, milhões de dólares foram investidos para estudar como aquilo que passamos na infância afeta nossa vida adulta. E não é para menos: a infância é, de fato, um período precoce, cheio de desenvolvimento e extremamente importante. Mas o problema é que, mesmo sendo um período tão estudado, ele não é o ponto de partida.
A infância já sofre influência do que acontece muito antes dela existir. Durante a gestação e no nascimento, experiências são registradas no corpo e na mente, moldando nossa forma de reagir e interagir com o mundo. Então, por que insistimos tanto em observar a infância como o ponto inicial?
A Resposta Está na Luz da Consciência
Imagine a seguinte história: Certa vez, um bêbado procurava pela chave de sua casa que havia caído e estava perdida. Um policial muito solícito, após observar esse bêbado procurando a chave, se dispôs a ajudar e perguntou: “O que o senhor procura aqui?”. E o bêbado, com a voz trêmula, disse: “A chave de casa”.
O policial se agachou e começou a ajudar o bêbado a encontrar essa chave. Passaram uns quinze minutos e não encontraram nada. Então, o policial perguntou: “Você tem certeza de que perdeu a chave aqui?”. E o bêbado respondeu: “Não, eu não tenho certeza, senhor policial.” O policial, confuso, perguntou: “Mas então por que você está procurando aqui?” E o bêbado respondeu: “Porque aqui é o único lugar onde tem luz.”
Essa história é uma excelente analogia para entender por que a infância é tão estudada e o período pré e perinatal, ignorado. A infância é visível. É muito mais fácil observar o que as crianças fazem, como se iniciou lá com Piaget observando seus próprios filhos. Mas o que acontece no útero? É uma parte invisível, oculta e, por isso, muitas vezes negligenciada.
No entanto, estudos sólidos da Psicologia Pré e Perinatal (PPN) vêm mostrando que já existe muita coisa acontecendo dentro do útero, embora não seja tão visível e acessível quanto a infância.
A Inconveniência de Considerar o Período Pré e Perinatal
A neurocientista Rachel Yehuda, uma das maiores referências no estudo do trauma transgeracional, mencionou algo profundamente incômodo no documentário “In Utero” (2015): “É uma verdade inconveniente que os fetos sintam coisas, é simplesmente inconveniente, porque se eles sentem, muitas coisas precisam ser repensadas.”
Repensar o quê? A forma como tratamos as gestantes, os tipos de parto, a maneira como fazemos terapia, as abordagens educacionais, tudo. É um convite desconfortável a rever paradigmas enraizados e a entender que o que acontece dentro do útero não é apenas uma fase preparatória para a vida, mas parte essencial da vida que precisa ser considerada.
Quando ignoramos essa dimensão, estamos fazendo o mesmo que o bêbado da história: procurando respostas apenas onde a luz está acessível, enquanto a verdadeira causa pode estar escondida em um lugar que não queremos olhar.
A neurocientista Rachel Yehuda, uma das maiores referências no estudo do trauma transgeracional, disse algo profundamente incômodo: “É uma verdade inconveniente que os fetos sintam coisas, é simplesmente inconveniente, porque se eles sentem, muitas coisas precisam ser repensadas.”
Repensar o quê? A forma como tratamos as gestantes, os tipos de parto, a maneira como fazemos terapia, as abordagens educacionais, tudo. É um convite desconfortável a rever paradigmas enraizados e a entender que o que acontece dentro do útero não é apenas uma fase preparatória para a vida, mas parte essencial da vida que precisa ser considerada.
Quando ignoramos essa dimensão, estamos fazendo o mesmo que o bêbado da história: procurando respostas apenas onde a luz está acessível, enquanto a verdadeira causa pode estar escondida em um lugar que não queremos olhar.
A Pesquisa de Martin Seligman e o Desamparo Aprendido
Para entender melhor como essas experiências moldam nosso comportamento, vale mencionar um dos experimentos mais conhecidos da psicologia: o estudo sobre o Desamparo Aprendido, realizado por Martin Seligman na década de 60. Em seu experimento, cães eram colocados em gaiolas onde recebiam choques inevitáveis. Inicialmente, eles tentavam escapar, mas, após sucessivas tentativas sem sucesso, desistiam e permaneciam apáticos, mesmo quando uma saída estava disponível.
O que isso mostra? Quando o sistema nervoso aprende que nenhum esforço traz resultados positivos, ele entra em estado de desistência. Agora imagine que esse padrão de esforço constante sem resultados satisfatórios pode ser aprendido ainda no útero ou durante o nascimento. Bebês que enfrentam complicações como cordão umbilical enrolado, placenta com insuficiência ou nascimentos traumáticos podem carregar essa marca inconsciente de que “viver é lutar sem resultados”.
O Trabalho de Alessandra Piontelli
Alessandra Piontelli, psicanalista e neurocientista, realizou um trabalho inovador ao acompanhar o desenvolvimento de fetos por meio de ultrassonografias detalhadas. Ela não parou por aí: após o nascimento, seguiu observando essas mesmas crianças por anos. No primeiro ano de vida, os bebês eram observados todos os meses. No segundo ano, a cada três meses. E depois disso, continuou acompanhando o desenvolvimento deles conforme cresciam.
E o mais impressionante? Os comportamentos que os fetos apresentavam dentro do útero continuavam visíveis na infância. Um dos casos marcantes foi o de dois irmãos gêmeos. Durante a gestação, um deles constantemente empurrava a irmã para longe, evitando contato. E quando cresceram, o padrão se repetiu: o mesmo irmão evitava contato físico e emocional com a irmã.
O Caso de Juliano: Claustrofobia e a Raiz no Nascimento
Juliano, um homem de 37 anos, sofria de claustrofobia severa. Mesmo após anos de hipnose e terapias convencionais e alternativas que exploravam traumas, seu medo de lugares escuros e apertados continuava. Ele acreditava ter chegado às causas mais profundas: quando tinha 7 anos, foi trancado no porta-malas de um carro por um primo; e quando tinha 3 anos, foi sufocado com um cobertor por seu irmão mais velho. Apesar de trabalhar essas memórias, o medo persistia.
Existe um ponto importante aqui. Esses eventos da infância são muito relevantes e impactantes, e eu poderia pensar que o trabalho terapêutico que ele realizou anteriormente foi ineficaz e precisaria ser refeito. Mas e se houvesse algo mais profundo que ainda não havia sido considerado? Essa dúvida me fez optar por investigar além do que já havia sido explorado. Perguntei a Juliano sobre sua gestação e nascimento. Foi então que descobri que ele havia passado por sofrimento fetal e um parto extremamente demorado. Durante o trabalho com a Terapia Somática PPN, focamos nos estágios 2 e 3 do nascimento — o processo de passar pelo canal de parto e os desafios de se libertar para o mundo.
O corpo de Juliano mostrou o quanto havia sido uma batalha: ficar preso naquele canal apertado e escuro sem saber se conseguiria chegar ao fim. Com a intervenção adequada, seu sistema nervoso pôde finalmente completar as respostas interrompidas. O resultado foi surpreendente: sua claustrofobia reduziu drasticamente.
Esse caso ilustra um ponto crucial: os eventos da infância eram importantes, mas na verdade eram repetições ou recapitulações do trauma de nascimento. Além disso, alguém que viveu essa experiência pode desenvolver sintomas variados, como medo de espaços fechados, dificuldade em completar tarefas, sensação de impotência diante dos desafios da vida, etc.
Aceitar que o período pré e perinatal tem um impacto profundo na vida humana exige coragem. Coragem para reavaliar conhecimentos estabelecidos, para questionar paradigmas e, acima de tudo, para enxergar aquilo que está escondido nas sombras. Mas enquanto continuarmos ignorando esse período crucial, é como tentar completar um quebra-cabeça com peças faltando.
Está na hora de trazer luz a essa parte esquecida do ser humano e finalmente compreender que a verdadeira transformação só acontece quando consideramos a história completa.
A Contribuição de Pesquisadores da PPN
Ignorar o período pré e perinatal é como procurar por respostas embaixo do holofote da infância, simplesmente porque é onde a luz está mais visível. Mas o que dizer das experiências que aconteceram na sombra, quando a criança ainda estava em formação? Se queremos entender e transformar padrões que nos limitam, precisamos ir além da infância.
A Terapia Somática PPN, por exemplo, trabalha com intervenções específicas que ajudam o sistema nervoso a processar experiências que foram registradas no corpo e que ainda influenciam nossas emoções e comportamentos. Não se trata de “corrigir” algo que foi instalado, mas de permitir que o sistema nervoso encontre uma nova resposta, um novo aprendizado.
A Verdade Inconveniente: O Período Pré-Natal é Ignorado Porque Dá Muito Trabalho Considerá-lo
Imagine que você passou anos colecionando peças de um quebra-cabeça. Todos os dias, você encontra novas peças e as encaixa cuidadosamente, formando imagens que fazem sentido para você. Durante esse processo, você se orgulha de como o quebra-cabeça está ficando completo.
Agora, imagine que alguém aparece e diz que as peças que você estava coletando são apenas metade do quebra-cabeça. Que existem outras peças fundamentais que você nunca considerou porque estavam enterradas, fora da sua visão.
Aceitar essa possibilidade não é fácil. Porque, se você decidir considerar essa informação, será preciso reavaliar todo o seu trabalho. Será preciso desmanchar partes que pareciam certas e reconstruí-las. É muito mais confortável acreditar que o quebra-cabeça está quase pronto, que a visão que você tem é a verdadeira. Mas o que fazer quando você percebe que algo ainda está faltando? Ignorar não faz o quebra-cabeça se completar sozinho.
Da mesma forma, muitos profissionais renomados e estudiosos continuam focando exclusivamente na infância. Afinal, esse é o período onde existe luz, onde os comportamentos podem ser observados e registrados com clareza. Mas o período pré e perinatal é uma parte oculta, menos visível, que exige novas ferramentas, novos métodos e uma disposição para rever o que se acreditava ser verdade.
Quando aceitamos que o período pré-natal e o nascimento são fundamentais, abrimos espaço para um conhecimento mais profundo. Não se trata de jogar fora o que já sabemos sobre a infância, mas de complementar, integrar e expandir a compreensão sobre o que realmente influencia o nosso desenvolvimento.
Se você sente que há algo na sua vida que nunca se resolve, um padrão que parece sempre se repetir, talvez a resposta esteja em um lugar que você ainda não olhou.
A chave para a transformação pode estar na parte mais esquecida do ser humano: o período pré e perinatal.
Pesquisadores como Alessandra Piontelli, David Chamberlain, William Emerson e Thomas Verny dedicaram suas vidas a demonstrar que os bebês não só sentem, mas interagem, aprendem e se relacionam ainda no útero. Esses pioneiros da Psicologia Pré e Perinatal documentaram, através de estudos clínicos e registros detalhados, como as experiências pré-natais e de nascimento moldam profundamente nossos padrões emocionais e comportamentais.
David Chamberlain, por exemplo, autor de “The Mind of Your Newborn Baby”, foi um dos primeiros a mostrar que bebês podem se lembrar do nascimento e que essas memórias influenciam sua vida adulta. Thomas Verny, com seu livro “The Secret Life of the Unborn Child”, trouxe evidências da sensibilidade fetal e da importância do ambiente emocional da mãe.
William Emerson, por sua vez, dedicou sua carreira a desenvolver métodos terapêuticos para acessar traumas pré e perinatais, ajudando pessoas a transformar padrões que se originam nesses períodos iniciais.
Esses estudos comprovam que o período pré-natal e o nascimento são fundamentais para a compreensão profunda do ser humano. A Psicologia Pré e Perinatal não é uma teoria isolada – é um campo validado por décadas de pesquisa científica e clínica.
Desafiando o Leitor a Refletir Sobre Suas Próprias Experiências
Agora, vamos fazer uma reflexão importante: E se eu te perguntasse como foi sua gestação e nascimento? Provavelmente, sua resposta viria a partir do que você ouviu alguém falar — como seus pais, uma parteira ou uma tia próxima. Embora eles possam contar coisas relevantes, esta é apenas a perspectiva de fora de alguém que testemunhou o evento.
Mas e quanto à sua perspectiva? A da pessoa que viveu tudo isso, de dentro para fora?
Um exemplo claro é quando a mãe relata que teve complicações na gestação ou que quase morreu durante o parto. Mas e para o bebê que estava dentro do útero? Como foi sentir que sua mãe quase morreu durante o nascimento? Qual o impacto disso em seu sistema nervoso, que estava se desenvolvendo e aprendendo o tempo todo?
Um ponto crucial é explorar essa perspectiva do pré-nato, que embora não seja tão visível e recordável com a mente, existem muitos manejos através da Terapia Somática PPN que permitem acessar essas informações na perspectiva de quem atravessou essas experiências.
O bebê, desde o útero, é como se tivesse perguntas fundamentais que precisam ser respondidas: ‘Eu sou bem-vindo aqui?’, ‘Estou no lugar certo?’, ‘Eu sou amado?’, ‘Eu pertenço?’, ‘Eu importo para o mundo?’. E o que responde essas perguntas são os acontecimentos que vamos passando durante a gestação e o nascimento.
Agora pense, como seria respondida a pergunta ‘Eu sou amado e aceito?’ se a mãe teve ideações abortivas ou até mesmo tentativas de aborto? Ou se, durante o nascimento, o bebê enfrentou um parto extremamente traumático e difícil?
Essa perspectiva traz um nível muito mais profundo de compreensão sobre nossos padrões de comportamento e como eles se originaram. Muitas vezes, achamos que nossa dificuldade em nos conectar com as pessoas, ou nossa crença de que o amor não é para nós, está enraizada na infância ou em experiências conscientes. Mas e se isso tiver começado muito antes, lá no útero, onde nosso sistema nervoso se desenvolvia e fazia de tudo para sobreviver e se adaptar?
Quando entendemos essa dimensão, percebemos que tentar mudar padrões apenas pela mente ou com afirmações positivas é como tentar resolver um problema complexo com uma ferramenta simplista. É preciso acessar o que está registrado no corpo, aquilo que foi aprendido em um nível primário.
Aceitar que o período pré e perinatal tem um impacto profundo na vida humana exige coragem. Coragem para reavaliar conhecimentos estabelecidos, para questionar paradigmas e, acima de tudo, para enxergar aquilo que está escondido nas sombras. Mas enquanto continuarmos ignorando esse período crucial, é como tentar completar um quebra-cabeça com peças faltando.
Está na hora de trazer luz a essa parte esquecida do ser humano e finalmente compreender que a verdadeira transformação só acontece quando consideramos a história completa.
Convite para a Vivência Pré e Perinatal e Formação para Profissionais
Se você sente que essas histórias e pesquisas fazem sentido e gostaria de explorar profundamente sua própria história, te convido para a Vivência Pré e Perinatal, a única imersão baseada na Terapia Somática PPN do Brasil. É aqui que trabalhamos com precisão essas memórias mais profundas, acessando as camadas que influenciam seus padrões atuais e permitindo uma transformação genuína.
Agora, se você é um profissional da saúde, terapeuta, psicólogo ou alguém que deseja ajudar outras pessoas a acessar essas experiências e transformar padrões que parecem impossíveis de mudar, o convite é para que participe da Formação em Cura de Feridas Pré e Perinatais. A maior formação da América Latina, que une teoria, prática e supervisão clínica para capacitar você a atuar com precisão e segurança.
Como Participar
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Referências Bibliográficas:
- Chamberlain, D. B. (1998). The Mind of Your Newborn Baby. Berkeley: North Atlantic Books.
- Chamberlain, D. B. (1988). Babies Remember Birth. Los Angeles: Jeremy P. Tarcher.
- Emerson, W. R. (2000). The Vulnerable Prenate: A Comprehensive Approach to Trauma Prevention and Healing. Pre and Perinatal Psychology Journal.
- Lake, F. (1966). Studies in Constricted Confusion. London: Darton, Longman and Todd.
- Piontelli, A. (1992). From Fetus to Child: An Observational and Psychoanalytic Study. London: Routledge.
- Seligman, M. E. P., & Maier, S. F. (1967). Failure to Escape Traumatic Shock. Journal of Experimental Psychology, 74(1), 1–9.
- Verny, T., & Kelly, J. (1981). The Secret Life of the Unborn Child. New York: Dell Publishing.
- Yehuda, R. (2015). In Utero [Documentary]. Directed by Kathleen Gyllenhaal. MRB Productions.
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