5 Coisas que Impedem a Conexão com a Mãe
07/08/2025
Você já sentiu que, por mais que tente agradar sua mãe, nunca é o suficiente?
Ou que existe um distanciamento emocional entre vocês, como se algo invisível bloqueasse a conexão?
Ao longo dos anos, acompanhei muitos clientes com esse mesmo sentimento.
Alguns querem, de verdade, sentir amor pela mãe… mas carregam uma raiva inexplicável dentro de si — e, por isso, vivem com culpa.
Outros crescem com a sensação de que nunca serão bons o bastante.
Não importa o quanto se esforcem, parece que nunca são totalmente amados, vistos ou compreendidos por ela.
Há também aqueles que, desde cedo, assumem uma postura rígida, quase como se fossem “os adultos da relação”.
Cuidam da mãe, tentam protegê-la, como se ela fosse frágil demais emocionalmente — e isso vira um fardo silencioso: o de ser pai ou mãe da própria mãe.
O que poucas pessoas sabem é que esses sentimentos não nascem do nada. A relação com a mãe começa antes mesmo do nascimento. E tudo o que vivemos entre a concepção, a gestação, o parto e os primeiros anos de vida molda esse vínculo de forma profunda.
Neste conteúdo, quero te mostrar cinco fatores que podem impedir uma conexão saudável com a mãe — e como esses fatores silenciosos continuam influenciando a forma como você se sente, se relaciona e até como vê a si mesmo hoje.

Sentimento de rejeição ou não acolhimento na concepção ou descoberta da gravidez
Nem sempre o início da vida é marcado por celebração.
Muitas gestações acontecem em contextos de dúvida, medo, insegurança ou até rejeição. Às vezes, a gravidez é um choque. Outras, é vista como uma ameaça à estabilidade emocional, financeira ou conjugal da mãe.
Mesmo que ela siga com a gestação e ame profundamente seu filho, o impacto dos primeiros momentos permanece registrado no corpo e no sistema nervoso do bebê.
Na Psicologia Pré e Perinatal, sabemos — a partir de pesquisas de William Emerson e David Chamberlain, pioneiros no campo da Psicologia Pré e Perinatal — que o pré-nato é um ser senciente: sente, percebe e responde às condições emocionais e ambientais desde os estágios mais iniciais da vida.
Se na concepção houve amor, desejo e vínculo, o bebê já pode sentir acolhimento e pertencimento.
Mas se o ato foi marcado por violência, frieza, ausência de vínculo ou estados alterados (como uso de álcool ou drogas), podem ser criadas impressões de dor, confusão ou rejeição — que moldam a psique e até o tecido corporal em formação.
Depois vem a implantação: aquele momento em que o embrião, ainda um blastocisto, precisa encontrar um ambiente receptivo no útero para se fixar.
Se a mãe está em estado de rejeição, medo ou ambivalência, isso pode ser literalmente sentido como:
“Não sou bem-vindo aqui.”
“O lugar que deveria me acolher é hostil.”
Em sessões de regressão somática, adultos relatam metáforas corporais fortes, como estar deitado em pedras pontiagudas ou abraçado por arame farpado.
Quando o “lugar de chegada” é frio, tenso ou ameaçador, nasce um padrão profundo de autoexclusão, esforço para pertencer e medo crônico de rejeição.
Na vida adulta, isso pode aparecer como:
- Raiva sem causa consciente da mãe
- Sensação de ser um fardo ou erro
- Medo de incomodar ou ser rejeitado
- Busca constante por aprovação, especialmente materna
- Dificuldade de confiar no amor que recebe
Quando o corpo lembra antes da mente
Um exemplo claro disso foi o caso de Isadora, 26 anos, grávida de seu primeiro bebê.
No primeiro mês de gestação, ela começou a sentir enjoos tão intensos que nada permanecia no estômago. Mesmo forçando a alimentação, tudo voltava. Preocupada com a nutrição do bebê, me procurou buscando uma explicação que fosse além da medicina tradicional.
Durante o processo, em uma sessão de escuta somática profunda, Isadora acessou espontaneamente a memória da implantação — aquele momento em que o embrião busca se fixar nas paredes do útero.
Nesse instante, ela sentiu com clareza: não era bem-vinda. Havia tensão, conflito e rejeição no campo emocional de sua mãe. Aquela gravidez não havia sido desejada.
Essa dor, vivida em silêncio celular, ficou registrada como um imprint. Agora, ao gerar uma nova vida, seu corpo revivia a mesma experiência de “não ser recebida”.
Ao reconhecer e elaborar essa memória, algo profundo se transformou. Os enjoos cessaram. Isadora voltou a se alimentar e, mais importante ainda, passou a nutrir a si mesma com mais presença.
Com isso, abriu espaço para uma nova história. Caso contrário, poderia, sem querer, transmitir à própria filha camadas de desconexão — não porque não a quisesse, mas por causa do trauma de implantação que ainda vivia no território silencioso de seu inconsciente.

Estresse, luto ou sobrecarga emocional da mãe durante a gestação
O bebê sente a mãe. Vive nela e através dela.
Quando a mãe atravessa períodos de estresse intenso, luto, medo, ansiedade ou sobrecarga emocional durante a gravidez, o bebê não entende cognitivamente o que está acontecendo — mas registra no corpo essas informações como verdades sobre o mundo e sobre si mesmo.
Não é um raciocínio. É uma sensação gravada no sistema nervoso: o ambiente é instável, o mundo é perigoso, não é seguro se abrir plenamente para a vida.
Frases internas comuns que emergem desse tipo de vivência são:
- “Preciso estar sempre alerta.”
- “É melhor não incomodar.”
- “Sou a causa da dor dela.”
- “Eu não posso errar.”
- “Sou responsável por fazê-los felizes do lado de fora.”
Essa última crença, mesmo que não seja consciente, pode se tornar um peso imenso. E, em níveis mais profundos, gerar ressentimentos invisíveis — a sensação de que nunca é possível relaxar ou simplesmente existir sem carregar uma função.
Esses registros não desaparecem com o nascimento. Ao contrário, moldam a forma como a pessoa se vê e se relaciona. Muitas vezes, há dificuldade para receber cuidado, para se permitir ser vulnerável, para sentir-se livre das expectativas externas.
E nem sempre se trata de rejeição direta. Às vezes, o que se instala é uma sobreposição de sentimentos — onde o amor e o vínculo são atravessados por dores não elaboradas.
Um exemplo disso foi o caso de uma outra participante de uma Vivência Pré e Perinatal cuja mãe havia perdido uma gestação ectópica três meses antes dela ser concebida. Essa perda nunca foi chorada, nunca foi elaborada pela família. Quando ela foi gerada, sua vinda foi muito celebrada — pelo pai, pela mãe e, especialmente, pelo irmão mais velho, que desejava muito ter uma irmã.
Durante o processo, ela conseguiu acessar um amor muito profundo vindo de seus pais e do irmão. Mas, ao se aprofundar nessa experiência, percebeu que havia algo estranho. O amor se transformava em dor. Era o luto não vivido daquela gestação anterior, o peso inconsciente de “substituir” aquele irmão perdido e a pressão para não errar — uma pressão que vinha também da mãe, que carregava a expectativa de que “dessa vez” a gestação precisava dar certo. Com o tempo, esse amor misturado à dor gerou nela sentimentos confusos e uma culpa silenciosa, pois não entendia por que algo tão bom às vezes trazia estranheza e incômodo.
Outro caso marcante foi o de uma mulher cuja mãe, no terceiro mês de gestação, perdeu um filho de oito anos que se afogou em um rio. É impossível dimensionar o tamanho da dor de uma mãe diante dessa tragédia — e estando, ao mesmo tempo, grávida.
A bebê que ela carregava perdeu completamente a conexão com a mãe naquele momento. Apesar de, racionalmente, a mãe reconhecer que havia uma nova vida em seu ventre, o vínculo emocional estava rompido pelo luto. Afinal, nenhuma nova vida substitui a perda de um filho.
No trabalho terapêutico, emergiu todo aquele luto congelado. Ao dar voz e espaço para que essa dor finalmente pudesse ser sentida, a participante pôde compreender por que carregava tantos ressentimentos silenciosos e um peso de culpa sem sentido aparente: ela havia crescido sem entender que, naquele momento, não foi rejeitada por quem era — mas que sua mãe estava imersa em uma dor imensa que nunca pôde ser compartilhada.
Esses exemplos mostram que, muitas vezes, a desconexão não é fruto de desamor ou descaso, mas de dores e lutos que ficaram sem lugar. E, para o bebê, a ausência emocional materna — mesmo que temporária — pode deixar marcas profundas, influenciando a forma como se relaciona, confia e se percebe pela vida inteira.

Experiências traumáticas no parto ou separação imediata após o nascimento
Mesmo que a gestação tenha sido tranquila, o momento do nascimento é um dos eventos mais intensos da existência humana — tanto física quanto emocionalmente.
É a primeira travessia.
O bebê sai de um ambiente úmido, aquecido, silencioso e contido, onde tudo está regulado automaticamente, e entra num mundo cheio de luzes, sons, vozes desconhecidas, toques abruptos e ar nos pulmões pela primeira vez. É uma transição profunda e radical. E, dependendo de como acontece, pode ser vivida como um trauma.
Cesáreas agendadas sem trabalho de parto, fórceps, ocitocina sintética, anestesia, aspiração, separação imediata da mãe — tudo isso pode causar um choque no sistema nervoso do bebê, ainda sem defesas formadas.
Imagine que você aterrissa num novo planeta… e ninguém te recebe.
Você busca calor, voz, acolhimento — mas encontra silêncio, luzes brancas, luvas frias, máscaras e paredes. Para o bebê, isso pode parecer abandono, mesmo quando há boas intenções.
E o corpo registra: “a vida lá fora é perigosa”, “eu estou por minha conta”.
Esse primeiro contato com o mundo externo — ou a ausência dele — molda a forma como o bebê se sente em relação à vida, à intimidade e à segurança nos vínculos.
Quando a separação da mãe acontece logo após o parto, o corpo perde sua principal fonte de regulação.
O cheiro da mãe, o toque da pele, o som do coração dela… tudo isso tem um papel fundamental na transição para o mundo. Sem isso, o sistema nervoso entra em colapso, e começa a se organizar para sobreviver sozinho — mesmo desejando profundamente o vínculo.
“A primeira experiência de conexão fora do útero deveria ser o colo da mãe. Quando esse colo falta, o corpo aprende a viver sem vínculo — mesmo desejando intimidade.”
⚠️ Intervenções médicas e traumas de nascimento: o corpo entra em estado de sobrevivência
Nem sempre é a separação o único fator. Muitas vezes, são as próprias intervenções obstétricas ou situações traumáticas durante o parto que colocam o corpo do bebê em modo de sobrevivência.
Uso de fórceps, extratores a vácuo, induções com ocitocina sintética, anestesia da mãe, nascimento prematuro, sofrimento fetal…
Mesmo que sejam feitas com boas intenções, essas experiências podem ser sentidas pelo bebê como invasivas, abruptas ou desorganizadas.
Quando isso acontece, o corpo do bebê libera hormônios de estresse, como adrenalina e cortisol, numa tentativa de sobreviver ao que está acontecendo.
E esses mesmos hormônios bloqueiam a produção de ocitocina — o hormônio essencial da conexão, do vínculo e da sensação de segurança.
Se o corpo está lutando para sobreviver, ele não pode relaxar para se vincular.
Assim, a memória corporal que se forma é de tensão, alerta, separação ou choque — mesmo que o bebê esteja, teoricamente, em segurança nos braços da mãe.
💬 Relato real
Trabalhei com uma mulher que havia nascido de cesárea agendada e sido separada da mãe logo após o nascimento.
Ao acessar essa memória corporal numa vivência, ela dizia:
“Parece que eu cheguei… mas nunca aterrissei. É como se a vida tivesse começado sem mim.”
Apesar de buscar vínculos profundos, ela se afastava toda vez que algo se tornava emocionalmente mais íntimo. Como se o amor provocasse o mesmo susto que seu corpo sentiu ao nascer: inesperado, intenso, desregulado.
Eu já ouvi em situações assim crenças como essas:
- “Não confio em ninguém.”
- “Preciso me virar sozinho.”
- “Eu me aproximo… mas depois me afasto.”
- “Ninguém está realmente lá para mim.”
Esses registros não são racionais — são somáticos.
Eles vivem no corpo, não no pensamento.
E só quando damos espaço para que essas memórias se expressem, elas podem, enfim, se reorganizar.

Quando a mãe está, mas não sente: o impacto da ausência emocional na gestação
Nem toda desconexão começa com um abandono explícito. Muitas vezes, ela nasce do que não aconteceu — da ausência de presença, de sentir, de troca.
Algumas mães estão fisicamente presentes durante a gestação. Cuidam da alimentação, fazem pré-natal, compram o enxoval. Mas, emocionalmente, estão ausentes.
Às vezes, por traumas não elaborados. Outras, por um estado depressivo, por um medo profundo ou por não terem sido preparadas para acolher emocionalmente outra vida dentro de si.
Para um feto, isso não é interpretado racionalmente. É sentido como um vazio existencial. Um silêncio afetivo que se grava nas camadas mais primitivas do corpo — aquelas que antecedem a linguagem.
Mesmo que, com o tempo, a mãe se torne presente e amorosa, o bebê de antes já havia concluído algo:
– “Eu não sou percebido.”
– “Eu não existo no coração dela.”
– “Eu preciso fazer algo para ser sentido.”
Essa ausência de presença sentida pode se transformar, mais tarde, em uma busca constante por validação, por reconhecimento, por provas de amor.
O corpo permanece em estado de espera, como se dissesse: “Será que agora ela me vê?”
Essa dor é sutil, mas profundamente somática.
Pode se manifestar como um desconforto constante, dificuldade de pertencimento, sensação de não ser visto mesmo em relacionamentos importantes.
Às vezes, não foi falta de amor. Mas a falta de presença sentida.
Um bebê pode sobreviver à ausência… mas, para se conectar plenamente, precisa sentir que existe no coração de alguém.
🌿 Um caso real: quando o corpo grita o que a mente não sabe
Durante uma Vivência Pré e Perinatal, atendi Elisa*, uma mulher de 33 anos que sempre se considerou “exigente demais” nos relacionamentos. Ela dizia que, mesmo quando era amada, algo dentro dela não conseguia confiar totalmente. Era como se faltasse sempre um “pouquinho a mais”.
Ao acessar memórias somáticas da gestação, Elisa começou a sentir uma ausência profunda. Uma solidão que não tinha forma nem nome.
Gradualmente, emergiu a imagem de sua mãe grávida, sentada à beira da cama, com o olhar perdido. Descobrimos que, naquela época, a mãe de Elisa atravessava uma depressão silenciosa — não diagnosticada, não nomeada, mas vivida intensamente.
Elisa começou a chorar, sem saber por quê. Seu corpo tremia. E então veio a frase:
“Ela estava… mas não estava comigo.”
Esse momento marcou uma virada em sua história interna. Pela primeira vez, ela pôde dar sentido àquela sensação de vazio inexplicável.
Não era carência. Não era exigência.
Era uma ausência emocional vivida quando ainda era um corpo em formação.
Com o tempo, Elisa foi conseguindo construir um novo tipo de presença dentro de si. Uma presença mais acolhedora, capaz de receber e confiar no amor do outro — porque agora, ela já não esperava mais por algo que não viria.
Ela havia nomeado a ausência. E ao fazer isso, pôde começar a sair dela.
*Nome fictício para preservar a identidade da participante.

A Síndrome do Fetoterapeuta: quando o bebê cuida da mãe
Um dos bloqueios mais profundos — e menos visíveis — na conexão entre mãe e bebê ocorre quando, ainda no útero, o bebê assume inconscientemente a função de cuidar emocionalmente da mãe. Essa inversão de papéis foi observada por William Emerson e Frank Lake, pioneiros da Psicologia Pré e Perinatal, que cunharam o termo “Síndrome do Fetoterapeuta” para descrever esse fenômeno.
Ainda no útero, o bebê sente os batimentos do coração da mãe, os hormônios que circulam em seu corpo e, sobretudo, absorve o campo emocional em que está mergulhado. Ele é sensível não só ao que é dito, mas também àquilo que está escondido no inconsciente da mãe: dores profundas, traumas não elaborados, memórias de abuso, abandono, violência ou perdas. O bebê, na sua imensa vulnerabilidade e amor, percebe — mesmo sem entender — que há algo quebrado. E então, muitas vezes, faz uma escolha invisível e comovente: “Eu cuido de você.”
É como se ele dissesse: “Já que você carrega tanta dor, eu não vou te causar mais nenhuma.” E passa a existir com cuidado demais. Cresce emocionalmente rápido, se comporta como se não precisasse, como se desse conta sozinho. É o bebê que não dá trabalho, que parece maduro desde sempre, que se adapta em silêncio — mas cujo silêncio carrega um preço.
Essa inversão de hierarquia, como reconhecem também as constelações familiares, bagunça profundamente os vínculos. A criança cresce com uma bússola interna invertida, colocando o outro em primeiro lugar, anulando suas próprias emoções, desejos e necessidades. Com o tempo, esse movimento de autoapagamento se transforma em um ressentimento invisível — porque, para ele, nunca houve espaço. Seus sentimentos não tinham lugar. A conexão foi construída em cima da renúncia — e não do acolhimento.
Já atendi uma mulher que, ao regredir à sua experiência uterina, se viu encolhida, tensa, contraída, como se quisesse desaparecer para não ser um peso para a mãe. Na infância, ela era tida como “a filha forte”. Mas por dentro, carregava exaustão, raiva e um vazio de nunca ter sido cuidada emocionalmente. Quando pôde nomear essa inversão e sentir sua própria dor, algo profundo se reorganizou dentro dela. Pela primeira vez, ela pôde reconhecer: “Eu era só um bebê.”
Essa vivência é mais comum do que parece. Veja o relato real de uma participante da Vivência Pré e Perinatal:
“Após essa vivência, houve uma transformação da nossa relação. Eu estava num momento de vida em que eu estava cuidando dela. Minha mãe ficou viúva, e após a morte do meu pai, a relação se complicou. Sempre foi complicada, desde a infância. Eu me sentia responsável por ela, como se precisasse cuidar. Isso me causava uma angústia muito grande, muito perturbadora. Vivíamos em conflito constante. E após a vivência, houve uma mudança nessa energia. É incrível: eu me libertei dessa minha obrigação. Agora, a nossa relação é mais leve, tranquila. Não existe mais conflito entre nós. Foi uma mudança radical. Foi realmente muito incrível.”
A libertação dessa dinâmica não vem de romper com a mãe, mas de retomar o próprio lugar como filho ou filha, e permitir-se sentir — de forma legítima e segura — as emoções que um dia foram deixadas de lado para proteger quem mais se amava. É um luto simbólico, mas também uma reconciliação com a própria história. E ela começa com uma pergunta simples e poderosa: “Quem cuidava de quem?”

Quando sua primeira conexão foi embora: a dor esquecida dos gêmeos sobreviventes
Para aqueles que são gêmeos sobreviventes, a primeira grande conexão da vida não foi com a mãe — foi com o irmão ou irmã que compartilhava o útero. É difícil explicar com palavras o que acontece entre gêmeos no ventre. Há uma intimidade visceral, uma sincronia que antecede qualquer linguagem, uma troca silenciosa que é também uma dança energética. Não é apenas o fato de estarem lado a lado. É uma percepção mútua de existência, uma companhia sem separação, um tipo de amor que não tem necessidade de ser conquistado. Ele simplesmente é.
Entre seres humanos, não existe conexão mais intensa e profunda do que a que acontece entre gêmeos no útero. E é justamente por essa força de vínculo que, quando um deles vai embora — seja por uma reabsorção silenciosa, uma perda precoce, um aborto espontâneo ou uma morte não reconhecida — a dor pode ser devastadora.
Mas essa dor costuma ficar oculta. Porque a memória não está registrada em palavras ou imagens — está gravada no corpo, nas emoções, nos padrões mais sutis de comportamento. A sensação de perda, abandono, vazio ou incompletude pode atravessar a vida como uma brisa gélida que a pessoa sente, mas não consegue nomear.
Quando a conexão seguinte — com a mãe — tenta se estabelecer, há algo que já não está inteiro. Eu costumo usar a metáfora da televisão: a conexão com o gêmeo era como uma TV 4K — com imagem nítida, limpa, intensa, perfeitamente sintonizada. Mas depois da perda, quando o bebê tenta se vincular à mãe, é como se a frequência não encaixasse. É como uma daquelas TVs antigas de tubo, com botão solto, som chiando e imagem fora de foco. Não é que a mãe não esteja ali. Mas a percepção do bebê é: “não é a mesma conexão”. E essa comparação, inconsciente e inevitável, pode dificultar o vínculo, gerar estranhamento, confusão emocional, ou até mesmo projeções sobre a mãe — como se ela devesse suprir a falta deixada pelo gêmeo.
Na vida adulta, esse padrão pode se manifestar de diversas formas: dificuldade em confiar no amor, medo de se entregar a um relacionamento, sensação de que sempre está faltando algo (ou alguém), idealizações amorosas, carência profunda, medo de perder quem se ama ou sabotagem dos próprios vínculos. Tudo isso pode estar enraizado na experiência de ter perdido aquele que foi, literalmente, o primeiro amor.
Essa é também a minha história. Nas minhas explorações internas, descobri que sou um gêmeo sobrevivente. E percebi que muitos sentimentos de cobrança e frustração com minha mãe tinham raízes mais profundas do que eu imaginava. Era como se, por dentro, eu esperasse dela o mesmo tipo de presença, sintonia e completude que havia sentido com minha irmã gêmea — e como isso era impossível, acabava me sentindo rejeitado ou não amado o suficiente. Ao tomar consciência dessa projeção e elaborar o luto pela minha irmã, algo se transformou dentro de mim. Pela primeira vez, consegui ver e sentir o amor real da minha mãe — aquele que sempre esteve ali, mas que antes era ofuscado pela comparação inconsciente com a perda que eu carregava no corpo.
Para os gêmeos sobreviventes, reconhecer essa dor é um ato de libertação. Porque não se trata de esquecer o que foi perdido, mas de honrar essa história, dar nome à ausência, elaborar o luto e abrir espaço para vínculos reais no presente.

Conclusão: o que aprendemos até aqui
Ao longo deste artigo, exploramos cinco caminhos ocultos que podem dificultar ou até impedir a conexão com a nossa mãe. Vimos que esse afastamento, muitas vezes sentido como um vazio ou uma desconexão inexplicável, pode ter raízes em experiências que começaram muito antes de termos memória — experiências que aconteceram no corpo, no campo emocional e nas dinâmicas sutis da gestação, nascimento e primeiros momentos de vida.
Aprendemos que:
- A sombra da rejeição, mesmo quando silenciosa, pode marcar profundamente a forma como nos vinculamos, como nos sentimos no mundo e como tentamos — ou tememos — nos aproximar da mãe.
- A inversão de papéis, quando o bebê se torna cuidador emocional da mãe, pode aprisionar a criança em uma posição de responsabilidade precoce, gerando culpa, ressentimento e dificuldade de receber afeto.Choques fisiológicos no nascimento, como separações abruptas, anestesia ou intervenções invasivas, podem romper o fio da conexão e inscrever no corpo um estado de sobrevivência, onde não há espaço para vínculo ou descanso.
- O luto não elaborado por perdas anteriores, mesmo quando não nomeado, pode contaminar a nova gestação com cargas invisíveis — transformando amor em confusão, expectativa em pressão e presença em ausência.
- A perda de um irmão gêmeo, para aqueles que passaram por essa experiência intrauterina, pode fazer da conexão com a mãe uma tentativa de substituir a ligação mais profunda já sentida — e interrompida cedo demais.
Esses caminhos não são sentenças. São portas de entrada para compreendermos por que muitas vezes sentimos dor, desconexão ou estranhamento mesmo em vínculos que deveriam ser amorosos. Quando reconhecemos essas raízes, deixamos de nos culpar por sintomas que não entendíamos — e passamos a ter a chance de resgatar a inteireza da nossa experiência.
Talvez agora seja o seu momento…
Se alguma parte deste texto tocou algo dentro de você, talvez seja porque está na hora de olhar para essas raízes com mais carinho e consciência.
A reconexão com a mãe — e com a sua própria história — não acontece apenas por palavras. Ela acontece no corpo, nas sensações, nos gestos interrompidos e nas memórias que ainda estão vivas, mesmo que você não se lembre com a mente.
A Vivência Pré e Perinatal é um espaço seguro e profundo para esse mergulho.
Uma imersão terapêutica baseada na Terapia Somática Pré e Perinatal onde trabalhamos com respeito, cuidado e técnica para acessar essas memórias precoces, liberar tensões do sistema nervoso e permitir que novos vínculos possam se formar — com você mesmo, com sua história e, quem sabe, com sua mãe.
Não é sobre culpar ninguém. É sobre libertar seu corpo da fidelidade ao trauma e criar espaço para uma nova experiência de presença, pertencimento e conexão.
Se esse chamado fizer sentido para você, será uma alegria caminhar ao seu lado.
INSCREVA – SE AGORA MESMO
Referências bibliográficas
CHAMBERLAIN, David B. Os Sentidos do Bebê: a ciência do vínculo pré-natal. Editora Ground, 1998.
→ Estudo clássico sobre a consciência fetal e os sentidos do bebê no útero.
EMERSON, William R. The Vulnerable Prenate: a pre- and perinatal perspective on the wounded child. Emerson Training Seminars, 2001.
→ Obra seminal sobre os impactos de traumas gestacionais, parto e vínculo precoce.
LAKE, Frank. Clinical Theology: A Theological and Psychiatric Basis to Clinical Pastoral Care. Darton, Longman & Todd, 1966.
→ Um dos primeiros autores a abordar o conceito de feto terapeuta e as inversões de papel no útero.
PIONTELLI, Alessandra. From Fetus to Child: An Observational and Psychoanalytic Study. Routledge, 1992.
→ Estudo profundo com observações de ultrassonografia sobre vínculo entre gêmeos e dinâmicas intrauterinas.
VERNY, Thomas R. & KELLY, John. A Vida Secreta da Criança Antes de Nascer. Editora Objetiva, 1981.
→ Uma das primeiras obras de divulgação científica sobre a psicologia pré-natal.
![]()

Aprender sobre os traumas intrauterino é algo realmente fascinante e muito elucidativo.
Ter respostas para comportamentos disfuncionais, aquece o coração.